Saúde psicológica na empresa

Saúde psicológica na empresa: uma questão de muitos “lados”

A questão da saúde mental ou psicológica na empresa é ainda um tema difícil de ser tratado e até mesmo discutido de forma aberta no ambiente corporativo atual. Na maior parte das vezes confina-se a discussão ao âmbito da medicina do trabalho e do plano de saúde, que fazem parte da gestão de RH.

No entanto as estatísticas oficiais apontam na direção de um problema que vem afetando grande parte da população e consequentemente as empresas. As causas psicológicas de afastamento do trabalho e o prejuízo na capacidade produtiva de empregados são os aspectos mais visíveis da questão.

Apenas para ilustrar:

  • segundo Ministério da Saúde (2001), os transtornos mentais ocupavam a terceira posição entre as causas de concessão de benefícios previdenciários como auxílio-doença, afastamento do trabalho por mais de 15 dias e aposentadorias por invalidez.
  • segundo o Instituto Nacional de Seguridade Social o número de afastamentos por transtornos mentais pulou de 3918 para 6403 no biênio 2007-2008.
  • segundo Ministério da Previdência Social  no biênio 2008-2009 o transtorno mental ocupava o segundo lugar no ranking de afastamentos temporários por problemas de saúde; o primeiro lugar ficou com as lesões osteomusculares.
  • os transtornos mentais, principalmente a depressão, representará até 2020 a segunda principal causa de incapacitação no trabalho em todo o mundo segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Diante disto é praticamente impossível diminuir a importância do tema para pessoas e empresas.

O mundo corporativo atual é reflexo da sociedade contemporânea inclusiva e principalmente das vicissitudes do mercado em que atua. Todas as mudanças e transformações de valores e comportamentos ocorridas neste meio impactaram e continuam impactando o comportamento humano dentro de empresas e organizações.  As exigências, fruto das mudanças organizacionais, que recaem sobre as pessoas até este momento são nossas conhecidas:

  • aumento dos requisitos de aprendizagem e de novas competências
  • necessidade de adotar novas formas de trabalhar, maior produtividade e mais qualidade do trabalho
  • aumento da pressão de tempo e de trabalhos estressantes
  • maior individualismo no ambiente de trabalho
  • menos tempo para os companheiros de trabalho e para socializar experiências, dificuldades e ajuda

Infelizmente nem todas as consequências das mudanças são positivas ou, dito de outra forma, nem todos (empresas e pessoas) reagem a estas mudanças da mesma maneira. Alguns (que estão se tornando muitos) adoecem e não conseguem se recuperar a tempo para a próxima mudança. Outros são mais resilientes (como preferem alguns) e resistem às pressões aparentemente de forma saudável. Quer dizer, pelo lado das pessoas estar preparado para esta nova realidade implica em desenvolver mecanismos de defesa pessoais para, minimamente, sobreviver com saúde mental e física. Pelo lado das empresas sabe-se que uma empresa saudável é feita de pessoas saudáveis.

Por outro lado os inegáveis avanços científicos nos campos da psiquiatria, psicologia, neurociência e neuropsicologia, entre outros, já nos mostraram que algumas pessoas carregam pré disposições de origem genética ou biológica para desenvolver transtornos mentais/psicológicos.

Isto tudo significa que estamos diante de um problema humano complexo, que requer um entendimento multi profissional e um endereçamento de soluções precisas e até mesmo corajosas.

Pelo lado da empresa, os custos com saúde representam o 2º maior investimento em pessoas estando atrás somente da folha de pagamento. Os indicadores demonstram a necessidade de otimização e conseqüente redução deste custo de forma racional e cuidadosa. Neste momento aparecem as vantagens de enfocar a promoção da saúde mental de maneira profissional.

Esta discussão alinha-se com a preocupação contemporânea de fazer do trabalho um lugar de saúde e de bem estar, e de enfrentar este “mal”, que até certo ponto se mostra silencioso e muitas vezes mascarado nos ambientes organizacionais contemporâneos: os transtornos mentais/psicológicos.

Muitas frentes de trabalho podem ser planejadas para serem abordadas e proverem algumas condições de melhoria nos indicadores de saúde psicológica no ambiente de trabalho (afastamentos, presenteismo, absenteísmo…). Para citar apenas duas poderíamos nos centrar na 1) Organização do trabalho (tarefas repetitivas, trabalho monótono, carga de trabalho excessiva, exigências contraditórias e falta de clareza na definição das funções, falta de participação na tomada de decisões que afetam o profissional e falta de controle sobre a forma de execução do trabalho, frustração com reconhecimento e recompensas, trabalho com exposição a riscos físicos, estilo de liderança inadequado, limitação de responsabilidade e autonomia…); 2) Protocolos de atendimento médico  e gestão do apoio social e do plano de saúde.

Além destas, existem outras tantas oportunidades de enfrentar e resolver adequadamente o problema.

Gestores, e profissionais em geral, não deveriam se constranger diante do tabu e do estigma da saúde mental/psicológica no ambiente organizacional. Poderiam se apoderar de conhecimentos que os permitissem um enfrentamento adequado da questão, que não significa assumir culpas ou indicar condenações, mas sim gerir o capital humano na direção da saúde e da produtividade. Até porque os transtornos mentais/psicológicos de que estamos falando, são amplamente conhecidos, são transtornos na maioria das vezes leves ou moderados, que contam com possibilidades de tratamentos conhecidos e eficazes e que sequer determinariam afastamentos do trabalho. No entanto, representam a segunda maior causa de absenteísmo nas empresas estando atrás somente das doenças ortopédicas. Chegam a significar afastamentos com tempo médio superior a 1 ano.

Desta forma, a velha suposição ou crença popular não cabe nesta questão: o louco neste caso não existe, só na fantasia de alguns.

Por todos, e apenas, estes lados apresentados não parece racional esconder ou negligenciar um fato organizacional tão relevante e de fácil encaminhamento.

Luis Felipe Cortoni
Luiz Massad
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