Comportamento humano compactado, reduzido, simplificado…

O mundo corporativo anda muito estranho nos dias atuais, principalmente em relação às questões do comportamento humano.

No embalo da velocidade das mudanças e do baixo entendimento do impacto que causam nas pessoas e nos ambientes de trabalho algumas coisas discutíveis estão acontecendo. Sempre na tentativa de ajudar (pelo menos é o que parece) profissionais e alguns ditos especialistas no comportamento humano no trabalho se esforçam para desenvolver fórmulas fáceis e milagrosas que acreditam podem resolver problemas complexos por natureza.

Uma breve navegação (apenas 35’) nas páginas do Linkedin um dia destes foi possível ler:

  • “4 razões da baixa produtividade”
  • “só existem 3 tipos de perguntas nas entrevistas de emprego”
  • “10 lições de liderança”
  • “3 coisas que os líderes criativos fazem”
  • “5 maneiras de construir sua carreira enquanto ainda estiver na universidade”
  • “como nunca ficar bravo no trabalho em 5 passos”

O que será que estas sugestões/regras/conselhos (como deveríamos chamar estas coisas?) pretendem? Pelo que parece pretendem ajudar aqueles que estão envolvidos com estas questões e/ou problemas.

É muito difícil que “estas coisas” estejam ajudando por alguns motivos.

Primeiro, pode estar frustrando quem está procurando respostas – e muitos certamente estão – para suas angustias e dúvidas porque dificilmente 4, 5 ou 10 “destas coisas” podem dar conta de questões e comportamentos tão complexos no dia-a-dia de uma empresa. Vamos tomar o exemplo da produtividade, alguém em sã consciência acredita mesmo que ela tem somente 4 razões para ser baixa? Ou, dito de outra forma, a produtividade de um profissional nos ambientes organizacionais contemporâneos tem somente 4 razões para estar diminuída? Portanto, podemos supor que o profissional que está enfrentando este tipo de problema hoje, e que lê estas “dicas”, no mínimo se frustra por provavelmente não ver as suas razões ali listadas. Como ele resolve isso?

Segundo, supondo que o autor das tais “4 razões” esteja resumindo as principais, aquelas que realmente impactam utilizando a fórmula 80/20 (ou seja 4 razões são 80% das razões de baixa produtividade individual) de novo está deixando alguém de fora, está centrando em um foco (como gostam tantos que formulam dicas) e perdendo vários que podem não ter nestes “conselhos” o seu problema atendido.

Terceiro, supondo que a ideia das dicas/conselhos/sugestões seja ajudar profissionais, a pergunta que seria importante ser feita é: assim é que se ajuda um adulto com um problema tão sério como a baixa produtividade nos dias atuais? Adultos precisam de respostas prontas, fórmulas mágicas e simplificadoras para se desenvolver ou o processo de desenvolvimento/aprendizagem de adultos se dá de maneira diferente? É obvio que esta pergunta traz a em si a resposta. Na andragogia o que interessa não é dar respostas mas melhorar a qualidade das dúvidas, só assim, nós adultos, crescemos.

Quarto, ainda no exemplo da produtividade, se o profissional envolvido com sua baixa produtividade tem como uma das causas já identificada por ele, por exemplo, um problema de relacionamento com seu chefe, ou uma angustia que o paralisa em função dos cenários internos e externos da empresa onde trabalha, ou uma depressão momentânea em relação à problemas fora do trabalho ou…. Todas estas e várias outras causas que poderiam ser citadas, podem ser resolvidas com um ou 4 conselhos? É este tipo de ajuda que este profissional precisa? É compreensível a intenção do autor em ajudar quando simplifica comportamentos, mas isso não é ajuda/acolhimento é simplesmente um “o seu problema é fácil de resolver, leia as dicas”. Sinceramente, ninguém ajuda pessoas envolvidas em problemas tão complexos desta forma.

Parece óbvio também que estas soluções mágicas são espelho de algumas condições de trabalho observadas hoje nas empresas. Esta realidade experimentada por vários profissionais (gestores e não gestores) implica em muita dificuldade de investir tempo para mergulhar em análises de problemas, em parar para refletir, aprofundar-se em conteúdos inerentes ao trabalho de cada um, parar para ouvir e pensar. Cada vez mais as agendas estão estranguladas, os problemas são tratados com rapidez e superficialidade, os profissionais experimentando um sentimento de estar sempre devendo alguma coisa a alguém, ao seu trabalho ou à empresa. Neste contexto parece que qualquer dica/conselho/lição é uma solução (porque é curta, direta, rápida), mas não é.

Agora, se você está preocupado com a sua sobrevivência nesta crise interminável, ali também é possível encontrar soluções fáceis, tais como: “enquanto uns choram na crise, outros vendem lenços de papel”. Brilhante, não acha?

Luis Felipe Cortoni

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